Por François Doyon[1]
Daniel Dennett é um dos mais importantes filósofos estadunidenses. Em sua última obra, Intuition Pumps and Other Tools for Thinking, ele nos ensina como propor respostas sérias, e às vezes mesmo elegantes, às mais difíceis questões que se pode colocar a um ser humano. Num extrato publicado sob o título de “Daniel Dennett’s seven tools for thinking”[2], ele dá sete breves dicas de autodefesa intelectual. Eis um rápido resumo.
1. Aproveite seus erros
Uma das características do ser humano é sua capacidade de refletir sobre seus erros. Ele pode se perguntar por que tal ideia lhe pareceu interessante e por que ela se revelou finalmente mais ou menos válida. Quando se comete um erro, deve-se analisá-lo impiedosa e friamente. Tente desenvolver o estranho hábito de saborear seus erros tendo o prazer de descobrir o que o fez errar.
Mas apenas isso ainda não é suficiente. Você deve se expor voluntariamente a cometer erros a fim de multiplicar as ocasiões de aprender. Os cientistas vão ainda mais longe: eles expõem deliberadamente seus erros publicando os resultados de seus trabalhos!
2. Respeite seus adversários
Quando se critica as ideias de um adversário, até que ponto é preciso interpretá-las de modo indulgente? Como resistir à tentação de caricaturá-lo? Veja como escrever um comentário crítico honesto:
- Apresente as ideias de seu adversário de forma tão clara e objetiva que seu autor poderia lhe dizer: “Obrigado, eu adoraria poder exprimir eu mesmo minhas ideias desse modo.”
- Mencione todos os elementos com os quais você concorda (sobretudo se se trata de ideias pouco populares ou marginais).
- Mencione tudo o que você aprendeu com seu adversário.
- É somente a partir desse momento que você poderá se permitir fazer críticas negativas.
Seguindo esse método, seus adversários ficarão mais dispostos a lhe escutar já que você terá demonstrado que compreendeu seu ponto de vista tão bem quanto ele mesmo e terá, assim, demonstrado um julgamento que reconhece os pontos fortes de sua posição.
3. Desconfie das certezas
Quando ler um texto argumentativo, sobretudo em filosofia, procure todas as ocorrências da palavra “certamente”: é quase sempre aí que se encontram os pontos mais fracos de uma argumentação.
4. Responda às questões retóricas
Uma questão retórica é uma afirmação formulada sob a forma de uma questão de modo a forçar o leitor a aceita-la como evidente. É preciso estar atento às questões retóricas em uma argumentação, pois elas frequentemente exprimem os atalhos intelectuais do autor. É preciso desenvolver o hábito de sempre tentar encontrar uma resposta ao mesmo tempo pertinente e surpreendente a uma questão retórica, isso pode servir para criticar as ideias de um autor.
5. Utilize a navalha d’Ockham
Atribuído ao filósofo do século XIV Guillaume d’Ockham, este princípio é simples: diante potenciais explicativos equivalentes, é preciso sempre privilegiar a teoria mais simples, isto é, a que implica a existência do menor número de entidades possível. Por exemplo, as leis de Kepler explicam mecanicamente a órbita dos planetas, é inútil, portanto, postular a existência de uma alma motora neles.
6. Não perca tempo com lixo
Existem muitos trabalhos medíocres em todos os domínios. Não perca seu tempo nem o de seus leitores criticando mediocridades. Concentre-se nos melhores trabalhos que encontrar, nas noções principais dos mais renomados autores de um campo de estudo, os trabalhos mais importantes e ignore o lixo.
7. Desconfie das profundidades
Uma profundidade é uma afirmação que parece ser tão profunda quanto verdadeira, mas esta aparência se deve unicamente a sua ambiguidade. A afirmação é manifestadamente falsa em um sentido, mas seria terrível se ela fosse verdadeira; em outro sentido, ela é verdadeira, mas absolutamente banal. O leitor desatento confunde o brilho de verdade do segundo sentido com a radical importância do primeiro, ficando completamente atordoado. É assim que funciona uma profundidade.
Eis um exemplo: “O amor é apenas uma palavra.”
Em um sentido, isso é evidentemente falso. Ninguém sabe o que é verdadeiramente o amor, mas todos nós sabemos que é mais que uma palavra. Pode-se também focalizar outro sentido dessa afirmação pensando que quando se fala de uma palavra, ela é escrita entre aspas. “Amor” é apenas uma palavra. “Cheeseburger” é apenas uma palavra. “Palavra” é apenas uma palavra. A frase “O amor é apenas uma palavra” quer dizer mais que isso. Mas ela apenas quer dizer algo sem dizê-lo.
Tradução de Carolina P. Fedatto.
[1] Disponível em: <http://www.academia.edu/3669184/Les_sept_petites_lecons_dautodefense_intellectuelle_de_Daniel_Dennett>. Acesso em 08 de junho de 213.
[2] The Observer, 19de maio de 2013 <http://www.guardian.co.uk/books/2013/may/19/daniel-dennett-intuitionpumps-thinking-extract>.
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